memória dos sentidos

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Às vezes gente é música. Você gosta de cara ou leva tempo. Assim que você ouve, você gosta. Mas depois pode cansar. Você enjoa. Gente é que nem música. Você detesta de cara, porque é estranho, extravagante, exótico. Detesta de cara. Mas dali a pouco, na convivência, aprendendo a escutar, está lá, já instalado em seu peito. Na eterna memória dos sentidos.
Tem música que antes era ótima, e agora não te interessa. Você mudou, e a música, aquela, não te preenche, não te esvazia, não te nada-coisa-alguma. Ela foi uma fase de uma fase sua que você nem vive mais. Gente é que nem música. Quando faz muito tempo, a gente precisa ouvir de novo. Talvez não precise. Talvez saudade presa na melodia de uma cena, o ritmo incessante de um capítulo, istmo de quem cante um título, alguém lívido, de lembranças harmônicas, o som de gritos de metais, ou de abraços de adeus fechados na última tônica, um refrão mal falado, cordas quebradas, letras esquecidas cantadas pelo meio, as curvas de um violão, o som saxofônico, pianíssimo…
porque gente é que nem música. Mas gente não é música. 
Talvez seja a saudade presa na melodia de uma cena.

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